Acompanhando na mídia boa parte das campanhas veiculadas nos últimos anos, surpreende que a publicidade tenha muitas vezes escondido ou abandonado o próprio produto que anuncia, como no caso dos carros, que, hoje, se apresentam como “divertidos porta-trecos”; dos planos de saúde, onde o produto é “família unida e risonha”; dos bancos, que foram além, desqualificando de tal forma o seu próprio serviço que a assinatura de uma grande instituição bancária é “o banco que nem parece banco”. O fato é que, dos supermercados aos empréstimos para aposentados, o produto se tornou um só: gente feliz (geralmente noruegueses). Deboche, acinte ou puro desprezo pela inteligência alheia, é bom ver peças como a exibida hoje na página 2 de O Globo. A chamada do cartaz é “Você quer ser herói ou vergonha de sua família?”. O redator mandou um papo direto e reto. A criação é da Assinap (que assina a peça, ao lado da Polícia Militar) e aprovação coube ao comandante-geral Erir Ribeiro. É um bom exemplo de como o texto publicitário pode ser incisivo – sem subterfúgios ou gracejos. Fala para o seu público-alvo e, ainda que de forma dramática, seu discurso não deixa margem à dúvidas. Destaque para o “olho” na parte inferior central, duplicando a imagem das algemas, revelando a preocupação em enfatizar a condição de detento do personagem (foto com atores, produzida especialmente para a ação). O plano de mídia prevê a colagem nos 39 quartéis do estado. Vale considerar que a ostensividade nem sempre é o melhor caminho para o texto publicitário, que procura as sutilezas que falem ao subconsciente – mas o caminho oposto, a negação do produto, leva inexoravelmente à irrelevância da propaganda.